Foi realizada nesta segunda-feira a Audiência de Instrução e Julgamento (AIJ) do processo em que o cabo do Batalhão de Operações Especiais (Bope) Leonardo Albarello é acusado assassinar o fiscal de supermercado Hélio Barreira Ribeiro, de 47 anos, num dos acessos ao Morro do Andaraí, Zona Norte do Rio, em 19 de maio do ano passado. Ele estava no terraço de sua casa, numa vila na Rua Ferreira Pontes, e segurava uma furadeira que foi confundida com uma submetralhadora pelo PM, que atirou e matou a vítima.
Vestido com a farda do Bope, Albarello — que aparentava tranquilidade — acompanhou os depoimentos de três testemunhas do Ministério Público e três arroladas por sua defesa, no plenário do 3º Tribunal do Júri da Capital. A sessão foi presidida pela juíza Simone Ferraz.
A primeira testemunha a ser interrogada foi o cabo do Bope Marcelo Costa Lemos, que estava com Albarello no momento da ação. Costa disse que a operação foi montada após o batalhão receber uma denúncia anônima de que dois traficantes estariam escondidos numa casa próxima à da vítima. Costa disse que ele e Albarello avistaram um homem no alto de uma casa, que segurava uma arma.
— Para a gente, era nítido que era uma submetralhadora — afirmou o cabo.
Costa disse que, antes de atirar, Albarello disse para o homem “Larga, larga (a arma)!”, mas não foi obedecido. Após atirar no suspeito, os dois se dirigiram à casa, e encontraram o homem baleado, caído ao chão. Segundo Costa, após não encontrarem nenhuma arma na laje, os PMs socorreram a vítima para o Hospital do Andaraí. Ainda de acordo com Costa, não havia tiroteio durante a incursão do Bope no local.
Viúva da vítima, Regina Célia Canellas Ribeiro, de 44 anos, foi a segunda testemunha a ser ouvida. Ela disse que estava com o marido no terraço de casa para pregar uma lona na madeira que sustenta o telhado. Ele subiu na escada para marcar os locais onde os parafusos seriam colocados, quando percebeu a aproximação de PMs do Bope.
— Ele desceu e disse que estava cheio de policiais do Bope na vila. Eu falei para a gente continuar o nosso trabalho porque aquilo não era problema nosso. Aí ele disse: ‘só falta eles confundirem a furadeira com uma arma’. E subiu na escada. Quando ele firmou a broca e ligou a furadeira, escutei o tiro. Com o impacto, ele voou da escada, bateu numa poltrona e ficou agachado, no chão. Aí um policial que estava em outra vila me xingou e disse para eu deitar no chão, senão iam atirar em mim também — contou a viúva, em lágrimas.
Célia negou veementemente que Albarello tenha dito para seu marido largar a suposta arma antes de atirar:
— Nada foi dito. Só o disparo.
A terceira testemunha arrolada pela acusação foi o perito criminal Marcelo Sanches, que fez os laudos de local e da reconstituição do crime. Segundo ele, de acordo com a distância que o policial estava da vítima e também com a incidência de raios solares no dia do incidente, era possível, sim, que o cabo do Bope tenha confundido a furadeira com uma arma:
— Qualquer objeto que ele (Hélio) impunhasse poderia ser confundido, sim.
O perito, entretanto, afirmou que como a rua é silenciosa, o aviso de advertência supostamente dado antes de o cabo da Bope atirar poderia ser ouvido pela vítima.
— No laudo, também fizemos testes do ruído da furadeira e de voz de comando. E ambos poderiam ser ouvidos.
A primeira testemunha de defesa a ser ouvida foi o sargento do Bope Eduardo de Lima, que também participou da operação no Morro do Andaraí. De Lima disse que Albarello ficou transtornado ao saber que havia atingido um homem de bem.
— (Os cabos) Costa e Albarello tinham absoluta certeza que o (suposto) elemento estava armado.
Psicóloga do Bope, a capitã Bianca de Souza Cirilo reforçou a versão:
— Depois dos fatos, ele (Albarello) procurou o atendimento psicológico do batalhão. Ele tinha certeza de que fez o disparo contra um marginal.
A última pessoa a ser interrogada foi o policial civil George Bento, da Divisão Anti-Sequestro (DAS), que em 2007 prendeu o então chefe do tráfico do Morro do Andaraí na mesma rua onde Hélio foi morto.
Advogado de Albarello, Yuri Sahione disse que os depoimentos reforçam a hipótese de que o cabo do Bope “não assumiu o risco de matar um inocente”:
— A função dele (Albarello) na operação era resguardar o avanço da outra parte da equipe. Como os traficantes se utilizam de planos mais altos na favela para atirar nos policiais, sua função era impedir que seus colegas fossem atacados. Naquela situação, para o acusado (e seu parceiro) havia uma situação de risco iminente. A postura do Senhor Hélio empunhando a furadeira demonstra que havia um perigo iminente para a realização do disparo contra os policiais que ingressavam na vila. Isso comprova a hipótese de que ele não assumiu o risco de matar um inocente e, por isso, deve ser absolvido.
A continuação da AIJ foi marcada para 11 de agosto, às 14h30m.