Quem mora nas grandes cidades já percebeu que sair de casa de carro tem sido uma verdadeira odisseia. Em Belo Horizonte, por exemplo, a situação beira o absurdo, o que se replica nas outras capitais do país. Independente do horário, pequenos trajetos são feitos em muito tempo em meio às buzinas, cruzamentos fechados, trança-trança de motos e pedestres e completa falta de gentileza. Aliás, onde anda a gentileza no trânsito?
O Brasil vive um boom de vendas recordes de veículos, mesmo custando os olhos da cara, e milhares de pessoas ganham as ruas em seus bólidos, o que é muito válido, afinal temos o direito de realizar nossos desejos e de nos locomover com mais conforto e segurança. Mas se as autoridades de trânsito não conseguem organizar as vias para receber cada vez mais motoristas o caos se instala. É público e notório que o investimento em infra-estrutura viária não anda na mesma proporção do número de carros que ganham as ruas anualmente.
Voltando ao exemplo da capital mineira, a cidade tem recebido um grande investimento na readequação de suas vias públicas. O complexo da Linha Verde, que liga o centro da capital à região do Aeroporto Internacional de Confins e à novíssima Cidade Administrativa, deu um fôlego novo ao trânsito caótico de vias como Antônio Carlos e Cristiano Machado. Ganhou corredores exclusivos para ônibus e táxis e muitos viadutos para evitar cruzamentos demorados.
O alargamento de faixas na Avenida do Contorno, na região da rodoviária, também pretende desafogar um dos maiores gargalos da cidade. A Savassi, na região centro-sul, passa por uma revitalização completa, com inversão de ruas, criação de alças de acesso e locais específicos para pedestres. Em meio a esse turbilhão de pó, máquinas e buracos – que tem como pano de fundo a recepção para a Copa vindoura – os motoristas insistem em viver em seus casulos, sem se importar com quem está ao lado. O estresse é visível.
Quando todos querem chegar ao mesmo tempo em casa o quanto antes e o trânsito empaca não há fiscal da BHTrans (órgão regulador do trânsito na capital) que dê jeito. E infelizmente a falta de educação impera. Em cruzamentos sem semáforo, ou em saídas de vagas de estacionamento, o motorista tem que contar com a sorte e a audácia de embicar o carro para conseguir passar, pois são poucos os que se lembram de dar passagem.
E os apressadinhos que fecham cruzamentos, criando uma reação em cadeia de buzinas e xingamentos? Das conversões proibidas e paradas em fila dupla nem se fala. Outros mais abusados não têm paciência com a massa de veículos 1,0 litro que se esgoelam nas ladeiras vertiginosas de bairros como Santo Antônio ou Buritis. Enfim, é um show de falta de civilidade que aponta o descompromisso do motorista brasileiro com o trânsito à sua volta.
As soluções apontadas pelos especialistas são muitas. A mais interessante, porém mais difícil de sair do papel, é o metrô. Em cidades maiores, como São Paulo, já pensam em cobrar pedágio em determinados espaços ou mesmo restringir o acesso aos automóveis. O problema em proibir a aproximação dos motoristas reside no fato de que o governo não oferece uma contrapartida, como transporte público de qualidade.
Uma amiga professora de BH disse que se pudesse sair de casa, pegar um metrô ou quem sabe um ônibus expresso e atravessar os cerca de 18 km que separam sua casa do trabalho de forma rápida e segura deixaria o carro em casa tranquilamente. Mas na atual conjuntura quem tem paciência para passar mais de uma hora (em horário de pico) dentro de um ônibus muitas vezes lotado?
Portanto a maior arma que os motoristas têm atualmente é a paciência. Dar passagem de vez em quando, ir um pouco mais devagar, respeitar o espaço público, tudo isso contribui para um trânsito mais civilizado. A correria e o estresse não justificam chegar em casa dois ou cinco minutos mais rápido, que é, no frigir dos ovos, o que se consegue com tanta irresponsabilidade. Enquanto não se investe em transporte público rápido, seguro e eficiente, que cubra toda a cidade, o motorista que se acha livre por ter seu próprio veículo continuará sendo refém de sua própria liberdade.
Por Thiago Mariz
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